A experiência autêntica da fé, posta em luz pela convocação de um ano
destinado a fazer crescer nos cristãos a consciência de suas convicções e a
testemunhá-las corajosamente, traz consigo consequências a um tempo consolador
e exigente.
Jesus Cristo não é um
escritor de obras famosas, como muitos de todos os tempos, até porque a única
vez que o vemos escrevendo foi na areia, no conhecido episódio da mulher
adúltera (cf. Jo 8). O vento apagou logo seus poucos escritos, mas nada apaga o
que ele é, tanto que muitos escreveram o que disse e fez, para conhecermos a
solidez dos ensinamentos (cf. Lc 1,4). Seria muito pouco considerá-lo apenas um
mestre, ainda que tenha arrebanhado atrás de si discípulos, dentre os quais
queremos também ser reconhecidos. Ele é Redentor, Salvador, Filho de Deus! Não
corremos atrás de ideias, mas seguimos uma pessoa, nada menos do que o Verbo de
Deus feito carne. Diante dele todo joelho se dobre e toda língua proclame que é
“o” Senhor (cf. Fl 2,5-11).
Homens e mulheres
de todas as raças, povos, línguas e nações (cf. Ap 7,9-10) o seguem e o
reconhecem Deus verdadeiro, o Cordeiro que tira o pecado do mundo, aquele que
tem a chave para abrir o livro da vida (cf. Ap 5,1-14) de todas as pessoas
humanas e da história. Encontrá-lo e aderir a Ele, na fé, dá sentido à
existência e possibilita entender os intrincados caminhos da aventura humana
nesta terra.
Tudo isso é
magnífico e ecoa altissonante pelos caminhos da história. No entanto, viver a
fé cristã é algo que se expressa na simplicidade do dia a dia, com gestos que
podem parecer prosaicos, mas são densos de sentido. Não se trata, em primeiro
lugar, de fazer grandes coisas, mas de realizar com alma grande os pequenos
gestos. A aventura cristã no mundo é marcada pela radicalidade no seguimento
corajoso de Jesus Cristo. Aquele que não se apegou a si mesmo, mas deu tudo,
tomando a forma de escravo, tornando-se semelhante ao ser humano (Fl 2,7), pede
a resposta e a reciprocidade da entrega de vida de cada cristão. Dizer “eu
creio” é povoar o horizonte da existência com gestos que revelem esta
radicalidade.
No Evangelho de São
Marcos, verdadeiro documento de identidade de Jesus Cristo (cf. Mc 1,1), o
leitor é provocado a ir ao encontro do Senhor, para reconhecê-lo como Filho de
Deus. Mas os modelos oferecidos por Jesus surpreendem pela simplicidade e
eloquência de seus gestos e atitudes. Um deles é apresentado pela palavra
proclamada nas missas do presente final de semana (Mc 12, 38-44).
A prática religiosa
de muitos aos quais havia sido confiada justamente a responsabilidade pela
orientação do povo, tinha se reduzido à competição, carreirismo, exploração e
exterioridades estéreis. A plebe ignara era relegada à margem, os pobres e
tanta gente simples considerados massa sobrante diante dos privilegiados da
sociedade e da religião. De repente, vem Jesus Cristo, depois de uma viagem
pelas margens do Jordão, Jericó e o deserto de Judá, e entra em sua cidade de
Jerusalém, acolhido com hosanas pelo povo. Radicaliza-se o confronto com as
autoridades, vistas como figueira que não dá fruto (Mc 11,14), purifica o
templo, enfrenta o bombardeio de perguntas que são verdadeiras armadilhas (Mc
12,13-34) e contempla, tranquilo, os gestos das pessoas que fazem suas ofertas.
Uma pessoa chama a atenção e é escolhida como um dos modelos privilegiados, uma pobre viúva que versa no cofre das esmolas apenas duas moedinhas, tudo aquilo que tinha para viver (Mc 12,42-44). Deu mais porque deu tudo! Jesus tem um modo radicalmente diferente para entender as pessoas e a vida. Acreditar nele é mudar a mentalidade e enxergar o sentido profundo de gestos semelhantes ao da viúva. Provavelmente, só no Céu ela soube que sua atitude percorre os séculos e se torna referência para tantas gerações!
Uma pessoa chama a atenção e é escolhida como um dos modelos privilegiados, uma pobre viúva que versa no cofre das esmolas apenas duas moedinhas, tudo aquilo que tinha para viver (Mc 12,42-44). Deu mais porque deu tudo! Jesus tem um modo radicalmente diferente para entender as pessoas e a vida. Acreditar nele é mudar a mentalidade e enxergar o sentido profundo de gestos semelhantes ao da viúva. Provavelmente, só no Céu ela soube que sua atitude percorre os séculos e se torna referência para tantas gerações!
O convite da
Palavra de Deus nos despoja de falsas pretensões, desejo de publicidade fácil e
orgulho estéril. É necessário olhar ao redor para identificar quantas viúvas
pobres ou tantas pessoas aparentemente insignificantes, para descobrir os
imensos tesouros de generosidade que edificam a vida e a Igreja. Por outro
lado, trata-se agora de converter-nos à simplicidade, olhar ao nosso redor,
para que ninguém passe em vão ao nosso lado, não desperdiçar qualquer
oportunidade para fazer o bem. E em relação a Deus, o olhar quase furtivo para
o Sacrário, o sinal da Cruz bem feito, as orações mais simples que sabemos, o
desabafo da oração espontânea, a renovação espontânea da fé, tudo conta, pois o
Senhor acolhe os gestos mais singelos, já que no Céu estão escritos os nossos
nomes! (cf. Lc 10,20)
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